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Jorge Perfeito

23 de maio, 2020

Olhar de Frente — Ver Diferente (O mundo mudou, não acabou!)

Já houve quem dissesse que a Europa é um continente inútil, povoado por uma população inútil. Passando ao largo do hiperbólico exagero, tal nos deve levar mais à reflexão do que a uma simples e liminar negação. De facto, o segundo menor continente do planeta (o mais pequeno é a Oceânia ‑ Austrália), do Atlântico aos Urais, com uma população a rondar os 745 milhões de habitantes, tornou‑se demasiado populoso, envelhecido, consumidor do supérfluo e altamente poluidor. Há mais de cem anos que esgotou quase por completo as suas reservas naturais, e as poucas indústrias extractivas ainda existentes são praticamente residuais, dependendo por isso, das reservas e riquezas naturais dos países situados nos continentes do hemisfério sul. A única coisa que tínhamos e detínhamos praticamente em exclusivo, a par dos Estados Unidos (que foram colonizados por europeus), era no domínio do conhecimento, o dito know‑how, das tecnologias de ponta, implementadas nas indústrias transformadoras para consumo, com o fito único do mercado planetário, a chamada globalização, que agora vemos entrar em declínio.

 

A avidez do lucro, do sistema capitalista de mercado e da sociedade de consumo, em que vivemos desde há dois séculos, levaram‑nos a este ponto extremo. Por causa disso, só no século XX (para não irmos mais atrás), a Europa foi responsável por dois conflitos mundiais, que causaram mais de 105 milhões de mortos, para além de um número indeterminado de inválidos, estropiados, e doentes crónicos. Perante isto, os números de qualquer pandemia soam a irrisórios. Por volta dos anos 30‑40 do século passado, o planeta possuía áreas selvagens na biosfera, ainda relativamente extensas; cerca de 67%, ao nível das florestas, da fauna, dos oceanos, e das reservas fósseis não renováveis. Por essa altura a população mundial rondava os dois mil e trezentos milhões de seres humanos. Presentemente a população mundial ascendeu a mais de sete mil milhões e restam apenas cerca de 25% dessas reservas selvagens da biosfera. Estima‑se que em 2050 seremos mais de dez mil milhões. Os números e a razão de ciência não enganam e há muito que se tem vindo a alertar para a tragédia quase inevitável do risco da sustentabilidade do planeta face a essa densidade populacional, acrescida do aumento da esperança média de vida e do consequente envelhecimento da população inactiva, dependente do estado‑providência, em crise por toda a parte, como bem se vê.

 

Quando a jovem sueca Greta Thunberg discursou na ONU, gerou mais uma onda de reacções críticas ao tom e modo revoltado com que o fez, em vez de como se esperaria, nos indignássemos e revoltássemos perante a evidência das alterações climáticas e contra as agressões ambientais que temos levado a cabo e estão à vista de todos. Desviamos o olhar do que é essencial e verdadeiramente interessa, e continuamos a discutir as minudências do supérfluo. A crise ecológica e ambiental torna‑nos mais vulneráveis, e até incapazes, face a surtos epidemiológicos de vírus e bactérias, que se espalham e propagam dum modo acelerado nunca antes visto. Megacidades com elevados índices de poluição, não param de crescer, albergando centenas de milhões de pessoas, quase todas no hemisfério sul, em países menos desenvolvidos, quando não extremamente pobres. Ao olharmos somente para o umbigo, preocupados em resolver no curto e médio prazo, aquilo que julgamos ser apenas mais uma crise económico‑financeira, confiando nos automatismos do mercado, com as consequências por demais conhecidas, em vez de vermos mais além, para o futuro do planeta e da humanidade, estamos a cometer um erro crasso. É tempo de reflectirmos e mudarmos de atitudes, sem necessidade de nos serem impostas.

 

Continuação de bom desconfinamento.

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