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José Poças

22 de outubro, 2021

E quando faltar a água?

Em 2005, o escritor David Foster Wallace realizou uma conferência na Universidade de Ohio, Estados Unidos. Perante uma plateia de jovens finalistas, num discurso que intitulou «Isto é a água», começou com a seguinte parábola: 

"Dois jovens peixes estão a nadar juntos e cruzam-se com um peixe mais velho nadando em sentido contrário, que lhes acena e pergunta: 

- Bom dia, rapazes. Que tal está a água?

Os dois peixes jovens nadam um pouco mais até que um deles diz:

- Que diabo é a água?"

Seria fácil gracejar com esta história, substituindo os jovens peixes por ministros ou deputados. O sentido da história dos peixes, como esclareceu Wallace, é que as realidades mais óbvias e importantes da nossa vida são frequentemente as mais difíceis de descortinar e debater. Acredito que o mesmo se passa com a nossa democracia.

Temos vivido desde o 25 de Abril de 1974 numa democracia com altos e baixos, com crises e momentos de pseudo euforia que geralmente dão lugar a profundas depressões económicas que vão destruindo o nosso futuro e o das gerações que nasceram já em plena democracia. 

Hoje em dia, vivemos tempos de ilusão em que julgamos que a bazuca da União Europeia, leia-se milhões de euros, irá resolver o problema estrutural do nosso país. Em Portugal, o Governo e os empresários estão de costas voltadas quanto à repartição de €14 mil milhões entre o sector público e o privado. Em Espanha, a aliança do Governo (apoiado pela extrema esquerda) às grandes, médias e pequenas empresas (PME) é visto como a base do desenvolvimento económico. A estratégia do governo socialista espanhol é aliar-se ao sector privado para transformar a economia, criar emprego e acelerar o PIB. Por exemplo, o Ministério da Indústria já congregou mais de 750 grandes consórcios para modernizar os sectores agroalimentar, automóvel, turístico, naval, electrónico, aeronáutico ou retalho. Abertos a todo o tipo de empresas — grandes, PME ou startups— existem os chamados Projectos Estratégicos para a Recuperação e Transformação Económica que unirão os esforços de diferentes actores públicos e privados para impulsionarem a competitividade ou enfrentarem falhas de mercado e desafios sociais que Espanha não resolveria de outra maneira. 

Em Portugal pelos vistos vamos voltar a obras de fachada, que não vão gerar senão empregos (leia-se tachos) para o sector público, agravando ainda mais a nossa dívida no futuro. Trata-se apenas de satisfazer os interesses particulares dos presidentes de Câmara e ministros com vista a assegurar a sua manutenção no poder, afastando o sector privado já que é esta a exigência ideológica dos partidos mais à esquerda do PS.

 

No Sermão de Santo António aos Peixes, em 1654, o Padre António Vieira dizia que: “A primeira coisa que me desedifica, peixes, de vós, é que vos comeis uns aos outros. Grande escândalo é este, mas a circunstância o faz ainda maior. Não só vos comeis uns aos outros, senão que os grandes comem os pequenos. Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenos comeram os grandes, bastara um grande para muitos pequenos: mas os grandes comem os pequenos, não bastam cem pequenos, nem mil para um só grande (...)”

 

É conhecido o momento em que mesmo os peixes mais alheados irão perceber o que é a água, é quando lhes faltar. E aí talvez os partidos que nos vão governando acordem (tarde mais) e descubram que os portugueses estão a votar em partidos da extrema direita e da extrema esquerda. E que o sistema político está completamente descredibilizado. E que nessa altura já não há água suficientemente limpa para que os peixes voltem a nadar despreocupadamente.

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